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Tudo sobre Reclamação Constitucional

RECLAMAÇÃO CONSTITUCIONAL


Prezados, vejamos hoje um assunto que tem sido muito abordado em precedentes do STJ e do STF, sendo um forte candidato em provas de concursos.


Espero que gostem!


Sumário:

1. Natureza jurídica da reclamação

2. Peculiaridades de processamento da reclamação

3. Cabimento

3.1. Reclamação por usurpação de competência

3.2. Reclamação por desrespeito à autoridade da decisão do tribunal

4. Conseqüências

5. Observações finais


1. Natureza jurídica da reclamação


Segundo Fredie Didier, a reclamação constitucional é uma ação de competência originária de tribunais, prevista na Constituição Federal e nas Constituições Estaduais, que tem o objetivo de preservar a competência e garantir a autoridade das decisões desses tribunais.


I. Posição da doutrina acerca da natureza jurídica da reclamação ==> AÇÃO


A reclamação é uma AÇÃO autônoma de impugnação de ato judicial, dependendo de provocação e contendo, inclusive, os elementos da ação: partes, causa de pedir e pedido. Ela provoca a jurisdição contenciosa, e não a voluntária, pois não se presta à “administração de interesses particulares”.


Distinções (Fredie Didier):


  • Natureza jurídica de ação X natureza jurídica recursal – A reclamação é ação, e não recurso, porque gera a CASSAÇÃO do ato judicial ou AVOCAÇÃO dos autos (e não a anulação ou a reforma da decisão) e não atende ao principio da TAXATIVIDADE dos recursos. Sua competência originária do STF e STJ (prevista na CF/88) reforça a idéia de que não tem natureza recursal. Ademais, diversamente dos recursos, que exigem a sucumbência, a reclamação não depende de derrota, resultado da vitória, tendo o recorrente interesse em que a decisão proferida que lhe fora favorável seja efetivamente cumprida ou, independentemente da derrota ou vitória, seja a competência do tribunal preservadaEnquanto os recursos possuem prazo, a reclamação não possui.


  • Natureza jurídica de ação X natureza jurídica de incidente processual – A reclamação não depende de que haja processo pendente ou, sequer, anterior, sendo possível o ajuizamento de reclamação em razão de inquérito policial em que esteja ocorrendo a usurpação da competência do tribunal superior. Da mesma forma, é possível também a reclamação com base em ato administrativo (ex: desrespeito a súmula vinculante)

  • Distinção entre reclamação e correição parcial – A correição parcial ou reclamação correição é uma medida administrativa tendente a apurar a atividade tumultuária do juiz não passível de recurso, que foi muito utilizada na época em que não se admitia recurso de decisão interlocutória de forma indiscriminada. Justamente por ser um mecanismo administrativo, a correição não serve para produzir, cassar ou alterar decisões jurisdicionais.


A conseqüência de a reclamação ter natureza jurídica de AÇÃO é que ela só pode ser disciplinada por lei federal (já que ação é matéria processual, de competência privativa da União). Além disso, a reclamação constitucional faz coisa julgada material.


II. Posição do STF acerca da natureza da reclamação


A Constituição prevê reclamação para o STJ e para o STF e a lei federal nº 8.038/90 a regulamenta. Durante muitos anos, o STF entendeu que, enquanto não houvesse lei federal regulamentando a CF, não caberia reclamação em Tribunais de Justiça.


Em 2003, no julgamento da ADI proposta contra a norma da Constituição Estadual do Ceará que prevê a reclamação para o TJ, o STF afirmou que a natureza jurídica da reclamação não é de ação, recurso ou incidente, mas de manifestação do DIREITO CONSTITUCIONAL DE PETIÇÃO (previsto no art. 5º, XXXI da CF). Sendo assim, não é competência privativa da União a sua regulação, sendo possível aos Estados prever a reclamação para o TJ, se houver previsão para tanto em suas Constituições Estaduais, de acordo com o princípio da simetria, aplicando-se a lei federal 8.038/90 por analogia.


No entender do STF não seria possível reclamação aos TRF’s, pois eles estão inseridos na Justiça Federal, e não na estrutura dos Estados-membros (como estão os TJ’s)[1].


Como corolário da decisão do STF, não seria possível a exigência de custas para o ajuizamento de reclamação.


Segundo Didier, para ser coerente com esse entendimento de que a reclamação é um exercício do direito de petição, a decisão da reclamação não poderia fazer coisa julgada, mas o próprio STF já se manifestou dizendo que faz. Ademais, não deveria ser exigida a capacidade postulatória, mas o STF exige.


OBS: Os tribunais superiores TST, STM e TSE prevêem a reclamação em seus regimentos internos. Sucede que, em 2008, o STF entendeu que essa previsão no regimento interno do TST era inconstitucional (o que, obviamente, vai acabar repercutindo nas outras previsões).


2. Peculiaridades de processamento da reclamação


A reclamação é uma ação que tem processamento semelhante ao MS. Esse processamento está regulado nos art. 13 e seguintes da lei 8.038/08. Veja:

a) Deve-se apontar a autoridade coatora reclamada, que praticou o ato impugnado;

b) A autoridade terá que prestar informações em 10 dias;

c) Pode ser sujeito passivo qualquer pessoa, órgão ou ente que descumpra decisão de tribunal ou usurpe sua competência. A entidade pode ser do Judiciário, Legislativo ou Executivo;

d) Cabe liminar;

e) Exige-se prova documental pré-constituída (não se admitindo a produção ao longo do procedimento);

f) O MP intervém obrigatoriamente (prazo: 5 dias);

e) Não cabem embargos infringentes na reclamação (ATENÇÃO!) – Súmula 369 do STF.


Súmula 369 do STF. Julgados do mesmo tribunal não servem para fundamentar o recurso extraordinário por divergência jurisprudencial.


ATENÇÃO: Em reclamação aplica-se o mesmo sistema recursal da rescisória, tirando os embargos infringentes.


DICA: O Resp só cabe de decisão de TJ ou de TRE, então se a questão diz que o STJ está julgando uma reclamação e pede para fazer o recurso, não se pode fazer um Resp (pois ele não poderá julgar Resp de sua própria decisão).


Só há um probleminha: quem é a outra parte na reclamação?


A lei não fala nada sobre a necessidade de citar o beneficiário do ato impugnado, mas a doutrina entende, não obstante o silêncio da lei, que é necessário citar o beneficiário do ato impugnado.


Embora não haja previsão de prazo para o ajuizamento de reclamação, ela não serve para impugnar decisões transitadas em julgado (quando já há trânsito em julgado do ato judicial que desrespeita a decisão, pois não pode fazer às vezes de rescisória):


Súmula 734 do STF - Não cabe reclamação quando já houver transitado em julgado o ato judicial que se alega tenha desrespeitado decisão do Supremo Tribunal Federal.


O Regimento interno do STF autoriza o julgamento monocrático da reclamação pelo relator, quando ela versar sobre tema já pacificado no tribunal:


Art. 161 do RISTF - Julgando procedente a reclamação, o Plenário ou a Turma poderá:

I - avocar o conhecimento do processo em que se verifique usurpação de sua competência;

II - ordenar que lhe sejam remetidos, com urgência, os autos do recurso para ele interposto;

III - cassar decisão exorbitante de seu julgado, ou determinar medida adequada à observância de sua jurisdição.


3. Cabimento


Independentemente de ser um direito de ação ou um direito de petição, a reclamação é TÍPICA; tem fundamentação vinculação (só cabe em hipóteses típicas, a exemplo da ação rescisória). Suas hipóteses são apenas duas:


3.1. Reclamação por usurpação de competência (para preservação da competência)


Cabe reclamação se a decisão reclamada houver usurpado a competência do tribunal para o qual se reclama. Pede-se para AVOCAR o processo. Neste caso, a reclamação funciona como instrumento de controle/preservação da competência. Exemplos famosos:

a) Recurso admitido no tribunal de origem, mas não enviado ao STJ. É possível reclamar ao STJ, dizendo-se o seguinte: “o tribunal, ao não enviar o REsp, está usurpando a sua competência”.

b) Presidente do TJ que não remete ao STJ/STF agravo do art. 544 do CPC contra decisão que negou seguimento a RE/REsp.

c) Reclamação contra o juiz que suspende o processamento da execução, em razão do ajuizamento de ação rescisória.

d) Eleição presidencial de 2002. Roseana Sarney era governadora e candidata à presidência. Um juiz federal havia determinado a busca e apreensão de determinada quantia numa das empresas dela. O advogado de Roseana entrou com reclamação no STJ, dizendo que este tribunal é que seria competente para autorizar essa diligência (de busca e apreensão), e não um juiz federal, já que ela era governadora. Alegou que o juiz federal havia usurpado a competência do STJ. O STJ acolheu o pedido, em razão do foro por prerrogativa de função.

e) Se a maioria do tribunal é suspeita, cabe ao STF decidir a causa. Para não ter que remeter a causa ao STF, o Tribunal costuma convocar juízes para compor o quorum. Ao fazer isso, o tribunal usurpa a competência do STF.


3.2. Reclamação por desrespeito à autoridade da decisão do tribunal


Neste caso, comunica-se ao Tribunal que há alguém desrespeitando suas decisões e pede-se para CASSAR a decisão. Sobre o tema, ATENÇÃO à decisão do STF, de 11 de abril de 2011:


RECURSO EXTRAORDINÁRIO E NÃO CABIMENTO DE RECLAMAÇÃO - Rcl 10793/SP

Não cabe o ajuizamento de reclamação contra decisão que, supostamente, teria afrontado entendimento firmado pela Corte em sede de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida. A via estreita da reclamação presta-se à garantia da efetividade de Súmula Vinculante ou de decisão proferida na lide individual de que se trata. Cabe aos juízes e desembargadores respeitar a autoridade da decisão tomada em sede de repercussão geral, na medida em que, no exercício de sua função, deveriam observar o entendimento do STF.


Cuidado também com a decisão abaixo, que indica o não cabimento da reclamação para aplicação do distinguishing no sistema de repercussão geral (o que pode ser estendido também para a sistemática do recurso repetitivo).


Repercussão geral e não cabimento de reclamação. Rcl 11250 AgR/RS. Inf. 622. 04/04/2011.

Não cabe reclamação para corrigir eventual equívoco na aplicação do regime da repercussão geral (ou seja, para dizer que um determinado recurso sobrestado não deveria seguir a regra do recurso representativo, por ser diferenciado – distinguishing). Asseverou-se que o filtro da repercussão geral perderia sua razão de ser se se admitisse que os recursos sobrestados ou mantidos no tribunal de origem fossem, por via transversa, remetidos ao Supremo, depois de já definida a questão da repercussão geral.


Exemplos de hipóteses de cabimento de reclamação:


a) O STF julga um recurso extraordinário e, na execução, o juiz o executa de maneira diferente. – cuidado para não confundir a reclamação com a execução. Para ensejar a reclamação com base no desrespeito à autoridade da decisão, é necessário que esta seja erga omnes (ex: decisões em ações coletivas). Se for inter partes, caberá apenas execução.

b) Reclamação por desrespeito à decisão final proferida pelo STF em ADI, ADC, ADO ou ADPF.

c) Reclamação por desobediência às liminares concedidas [ou negadas] nestas ações.

OBS: Será possível, ainda, manejar reclamação contra órgãos jurisdicionais que não estejam aplicando a norma por considerá-la inconstitucional com base na negativa de liminar em ADI. Quando o STF nega liminar em ADI, sendo esta uma ação dúplice, está ratificando a presunção de constitucionalidade do ato impugnado, mantendo sua plena eficácia, o que deve ser respeitado pelos demais órgãos.


d) Reclamação para fazer valer o fundamento de um julgamento de ADI (caso em que o STF julgou procedente a reclamação contra ato do juiz de Goiás que teria desrespeitado o entendimento empossado na ratio decidendi de uma ADI no sentido de que lei estadual não poderia ter aquele conteúdo).

e) Com a EC n. 45, passou-se a prever a reclamação por desrespeito às Súmulas vinculante do STF, com a peculiaridade de que pode ser ajuizada contra ato administrativo que desobedece a Súmula vinculante (mas, nesse caso, somente se houver exaurimento prévio das instâncias administrativas – art. 7º da lei 11.417/2006 à para Fredie, em situações de urgência é possível afastar essa exigência). Atenção: Nos demais casos, se há desrespeito da decisão por agente administrativo, cabe simples petição ao juízo, e não reclamação.[2] A reclamação contra ato que desrespeita Súmula vinculante é sem prejuízo dos outros recursos ou meios de impugnação.


f) Como não cabe Resp das decisões das Turmas Recursais, elas se sentiam livres para dar à lei federal interpretação diferente daquela dada pelo STJ. Um sujeito, indignado com isso, interpôs RE, alegando inconstitucionalidade. O STF decidiu que o RE não cabia (pois não havia inconstitucionalidade), mas indicou o ajuizamento de reclamação no STJ. O STJ editou a resolução 12/2009 para regulamentar o assunto, aceitando reclamação contra decisão de Turma Recursal Estadual que desrespeita interpretação de lei federal dada pelo STJ.


ATENÇÃO: Nas Turmas Recursais Federais não se admite reclamação para o STJ, pois lá há previsão de recurso de uniformização de jurisprudência.


Extraído da notícia do site do STJ: “A suspensão liminar disposta no art. 2º, I, da Resolução12/2009 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) – que disciplinou o ajuizamento de reclamações para impugnação de decisões dos juizados especiais estaduais contrárias à jurisprudência consolidada no STJ – não atinge os processos com decisões já transitadas em julgado perante os juizados de origem, ainda que pendente de execução judicial”.


Em processos SUBJETIVOS, não é admitida a reclamação em que se alegue descumprimento da decisão judicial por autoridade administrativa (somente o descumprimento por autoridade jurisdicional permite a reclamação). Nesse caso, cabe simples execução do julgado, mediante petição, nos próprios autos, em que se deve pedir que seja determinado o cumprimento do acórdão.


Já em processos OBJETIVOS, admite-se a reclamação por descumprimento da decisão pelo órgão jurisdicional ou administrativo, pois o efeito vinculante nas decisões proferidas em controle concentrado de constitucionalidade abrange a Administração Pública e o Poder Judiciário (salvo o próprio STF e o Poder Legislativo, que não ficarão sujeitos a reclamação).


4. Conseqüências


A reclamação gera não a anulação ou reforma da decisão exorbitante, mas a sua cassação ou a avocação dos autos, para observância da competência do tribunal.


Art. 17. Julgando procedente a reclamação, o Tribunal cassará a decisão exorbitante de seu julgado ou determinará medida adequada à preservação de sua competência.


5. Observações finais


a) Da decisão na reclamação cabe a interposição de recursos, a exemplo dos EDcl, agravo interno, embargos de declaração, recurso especial e recurso extraordinário;

b) É possível a concessão de provimento cautelar;

c) Exige-se capacidade postulatória (por isso que Fredie que é ação!);

d) Não é incidente processual e não se sujeita a qualquer prazo preclusivo;

e) Pode haver reclamação sem que sequer haja processo anterior, mas simples inquérito policial;

f) Sua decisão produz coisa julgada material;

g) Segundo o STF, sua previsão situa-se no âmbito do direito constitucional de petição; logo, a adoção pelo Estado-membro, pela via legislativa local, não implica em invasão da competência privativa da União para legislar sobre processo. Fredie discorda dessa natureza. De qualquer forma, prevendo a Constituição Estadual reclamação para o TJ, não há qualquer problema. É preciso atentar à incoerência do STF: apesar de entender se tratar de direito de petição, o Supremo exige: custas, capacidade postulatória, formalidades etc. Além disso, admite a cosia julgada.

h) Para o STF, não se vislumbra reclamação para os TRFs, por ausência de previsão,


[1] Para Didier, esse entendimento é contraditório com a afirmação de que a reclamação é exercício do direito de petição. O certo seria que fosse cabível a reclamação junto aos TJ’s, TRF’s e até juízes de primeira instância, mas esse não é o posicionamento do STF.


[2] Ex.: se a decisão do STJ/STF, proferida em ação originária, não for cumprida por autoridade administrativa, não caberá reclamação, mas simples execução do julgado.

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